Artigo: A improbidade administrativa não deve acarretar a cassação da aposentadoria
As normas do ordenamento jurídico não preveem a cassação da aposentadoria do agente público condenado por ato de improbidade administrativa.
Em conformidade com o art. 37, §4º, da Constituição Federal de 1988, a Lei de Improbidade Administrativa (Lei 8.429/1992), em seu art. 12, estabelece como sanções decorrentes da sentença que condena o agente público por ato de improbidade administrativa, “a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário” (a lei também prevê a possibilidade de aplicação de multa, proibição de contratar com o poder público e de recebimento de benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios).
Assim, não há previsão expressa para cassação da aposentadoria. Apesar disso, o Superior Tribunal de Justiça vem manifestando, em recentes julgados, que a cassação da aposentadoria deve ser imposta como “decorrência lógica” da perda do cargo, sanção esta expressamente prevista.
Porém, é princípio basilar do direito que não se pode condenar a uma pena não prevista explicitamente pela lei. A Constituição Federal também estabelece que alguém somente pode ser obrigado a fazer ou deixar de fazer algo senão em virtude de lei (art. 5º, inc. II). Esse dispositivo serve justamente para proteger o indivíduo contra arbitrariedades do Poder Estatal. A Constituição igualmente prevê a observância do princípio da legalidade especificamente na seara do direito administrativo (art. 37, caput).
Por consequência, o direito tampouco permite ampliar as hipóteses legais para punir alguém de um modo não estabelecido (há, inclusive, no Direito Penal, a máxima de que é nula a punição se não há prévia imposição da lei – nulla poena sine lege. Portanto, a ideia é a de que o magistrado não deve promover a “integração” da lei ou a sua interpretação ampliada/extensiva.
Recolhimentos previdenciários
Finalmente, cassar a aposentadoria e impedir que o agente condenado receba seu benefício previdenciário (aposentadoria) sem expressa previsão legal equivale a ignorar os recolhimentos previdenciários promovidos por ele. A não percepção do benefício pelo servidor após anos de contribuição caracteriza uma transferência patrimonial indevida e, assim, o enriquecimento sem causa por parte do estado (“enriquecimento ilícito”), que se apropria de riqueza que não lhe pertence.
Sendo assim, por ausência de expressa previsão legal e constitucional e, ainda, por violação ao enriquecimento sem causa do estado, não é razoável a cassação da aposentadoria de servidores condenados por ato por ato de improbidade administrativa.
Por Vinicius Pinheiro de Sant’Anna, advogado/sócio em Pinheiro de Sant’Anna & Advogados Associados e mestre em Processo Civil Constitucional pela Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes).