A mitigação do direito de ação pelo Supremo Tribunal Federal – Análise crítica
Na sessão desta quarta-feira (14), o Pleno do Supremo Tribunal Federal reiterou lamentável entendimento segundo o qual “a ação por danos causados por agente público deve ser ajuizada contra o Estado ou a pessoa jurídica de direito privado, prestadora de serviço público, sendo parte ilegítima o autor do ato, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa” (RE 1027633).
Da leitura do art. 37, §6º, da Constituição da República, não se extrai a conclusão adotada pelo Supremo para afastar a possibilidade de a demanda ser proposta pela vítima somente ou inclusive contra o causador direto do dano.
O dispositivo constitucional citado visa somente à aplicação ao Direito Público o que vale para o Direito Privado (responsabilidade pelo fato de outrem – disciplinada pelo Código Civil nos art. 932 a 934).
No texto está estabelecido que as pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado respondem por atos de seus agentes que nessa qualidade causem danos a terceiros. Além disso, assegura o direito de regresso, autorizando as pessoas jurídicas a serem ressarcidas, acionando o causador direto do dano.
Portanto, diferentemente da interpretação dada pelo STF não se infere do dispositivo norma que estabeleça que a vítima não possa demandar direta ou exclusivamente contra o causador direto do dano.
Esse posicionamento cria uma “proteção odiosa” em benefício do causador direto do dano (agente público) em detrimento do direito da vítima, que é quem deveria ser protegida. Aliás, a vítima ainda poderia obter resultados mais céleres. Em primeiro lugar porque as pessoas de direito público têm prerrogativas processuais, como prazos maiores para se manifestar etc., o que o agente, pessoa física, não tem.
Além disso, a vítima também poderia receber o dinheiro da condenação mais rapidamente (pois não estaria sujeita ao regime de precatório, que a depender do valor da condenação é necessário), especialmente nos casos de categorias de agentes públicos que são ricos.
Por fim, a vítima poder acionar exclusivamente o agente público, o causador direto do dano, ainda representaria economia para o Estado (para o contribuinte), que não arcaria com os custos da ação indenizatória ajuizada pela vítima e nem os da ação regressiva contra o agente (causador direto) – que nem sempre é feita.
O entendimento do STF vai de encontro ao princípio da inafastabilidade do poder judiciário e ao próprio direito de ação, violando a regra de que cabe ao demandante escolher contra qual responsável prefere demandar.
Por Vinicius Pinheiro de Sant’Anna, advogado/sócio em Pinheiro de Sant’Anna & Advogados Associados e mestre em Processo Civil Constitucional pela Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes).